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O uso excessivo de expressões condicionantes em um documento oficial pode ser um forte indicativo de incerteza ou falta de provas concretas. No caso do relatório final do chamado “inquérito do golpe”, da Polícia Federal, essa característica salta aos olhos. Palavras como “possível”, “suposto” e “hipotética” aparecem centenas de vezes ao longo das 884 páginas do documento, deixando dúvidas sobre a solidez da narrativa apresentada. Quando a base de uma investigação se ancora em possibilidades e não em fatos concretos, o que resta é uma peça especulativa, mais próxima de uma tentativa de convencimento do que de um relato objetivo dos acontecimentos.
O levantamento de 207 expressões condicionantes ao longo do relatório demonstra uma preocupação mais em sugerir do que em provar. Termos como “possibilidade”, que aparece 47 vezes, “teria” ou “teriam”, mencionados 107 vezes, e “hipótese” ou “hipotética”, citados 25 vezes, revelam um tom especulativo em um documento que deveria primar pela precisão. Essa escolha lexical sugere que a própria Polícia Federal não está plenamente segura das acusações que apresenta, o que compromete a credibilidade do inquérito.
A repetição dessas palavras não é apenas um detalhe no estilo, mas um sintoma de fragilidade investigativa. Um relatório policial sólido deveria se basear em evidências claras, não em suposições. Quando a incerteza permeia o texto, o leitor é levado a questionar: se há tantas dúvidas, onde está a substância da acusação?
O verbo “teria” e suas variantes, formas do futuro do pretérito, expressam ações que poderiam ter ocorrido, mas cuja concretização não é confirmada. Em um inquérito, cuja função é estabelecer fatos com clareza e embasamento, o uso excessivo desse tempo verbal soa deslocado. Se algo “teria acontecido”, mas não há certeza, onde estão as provas que sustentam essa afirmação? A resposta parece ser: em lugar nenhum.
Essa formulação recorrente enfraquece a narrativa e levanta suspeitas sobre a real intenção do documento. Um texto que deveria ser assertivo torna-se evasivo, quase como se buscasse evitar responsabilidades por afirmações categóricas. A ausência de certeza mina a confiança no inquérito e reforça a percepção de que ele se sustenta mais em conjecturas do que em evidências.
Paradoxalmente, este inquérito, classificado como sigiloso, tornou-se um dos mais divulgados da história recente, com trechos sendo vazados seletivamente para a imprensa. Esse movimento levanta questionamentos sobre a imparcialidade do processo. A denúncia que deve emergir desse relatório poderá ser quase anônima, tamanha a falta de embasamento sólido – ao ponto de o próprio Procurador-Geral da República talvez hesitar em assiná-la.
A possibilidade de interesses políticos guiando o inquérito não pode ser ignorada. Quando um documento oficial, que deveria ser técnico e imparcial, parece atender a uma agenda externa, sua legitimidade fica comprometida. O sigilo, nesse caso, parece mais uma fachada do que uma realidade, enquanto os vazamentos sugerem uma manipulação da opinião pública.
Quando uma notícia contém “pode” ou “teria”, não se trata de um fato, mas de uma especulação. Manchetes sensacionalistas frequentemente recorrem a essa estratégia para capturar a atenção do público, mas um inquérito policial não deveria seguir essa lógica. A presença maciça de palavras condicionais no relatório do “golpe” é um indicativo claro de que as provas concretas são escassas ou inexistentes.
Esse tom sensacionalista compromete a seriedade da investigação. Se o objetivo fosse relatar a verdade de forma objetiva, não haveria necessidade de recorrer a tantas hipóteses. A narrativa, assim, parece mais destinada a impressionar do que a informar, um traço incompatível com a função de um documento oficial.
O brasileiro tem um forte senso de justiça e se sensibiliza quando vê alguém sendo perseguido de forma injusta e implacável. O inquérito do “golpe”, repleto de condicionantes e hipóteses, levanta mais dúvidas do que respostas e sugere que a narrativa oficial pode não estar sustentada em fatos concretos. Se a verdade fosse clara e inquestionável, não haveria necessidade de recorrer a expressões tão vagas. Afinal, quem tem provas, afirma. Quem não tem, sugere.
Por Carlos Arouck Imagem Ralph Lichotti
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