A travessia quântica da Justiça

Por Jorge Tardin Advogado, professor e tesoureiro da OAB/Búzios

A travessia quântica da Justiça

A computação quântica já não pertence ao futuro: ela está entre nós, ainda silenciosa, mas inevitável. No campo da Justiça, representa mais do que uma inovação tecnológica — é um convite filosófico à transformação do próprio modo de julgar.

Ao contrário da lógica binária que sustenta o Direito há séculos — o sim ou o não, o legal ou o ilegal —, a lógica quântica opera com superposições, incertezas e múltiplas possibilidades coexistentes. Ela não busca apenas respostas rápidas, mas a compreensão profunda do contexto, das consequências e dos vínculos ocultos entre os fatos. E é exatamente disso que o sistema de Justiça brasileiro mais precisa.

Vivemos há décadas sob o peso de uma Justiça morosa, excessivamente formal, muitas vezes distante da realidade social que deveria transformar. Agora, temos a chance de atravessar esse paradigma — com coragem, lucidez e compromisso democrático. A tecnologia quântica pode oferecer ao Judiciário a capacidade de simular cenários complexos, projetar impactos e propor soluções com um grau de precisão e sensibilidade inédito. Isso não é ficção científica: já há, hoje, capacidade técnica para que um único computador quântico processe a integralidade da carga judicial brasileira em tempo real.

Mas essa travessia exige cuidado. Exige regulação, ética e institucionalidade. Exige que a Justiça continue sendo humana, mesmo quando assistida por máquinas. Caberá ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) liderar essa transição, garantindo que todos os tribunais — dos grandes aos mais modestos — tenham acesso equitativo a essa nova arquitetura. Mais ainda: que nenhum direito seja atropelado em nome da eficiência.

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), por sua vez, terá papel decisivo. Deverá ser a guardiã da soberania do cidadão sobre o algoritmo. Defender o contraditório, exigir a explicabilidade das decisões automatizadas, promover formação técnica para os operadores do Direito e evitar que a tecnologia se torne um novo instrumento de exclusão.

O momento pede grandeza institucional. Por isso, proponho três passos concretos:

  1. Tribunais-experimentais com IA quântica, testando soluções em ações repetitivas, ambientais e estruturais;
     
  2. Um marco ético nacional para decisões algorítmicas, assegurando transparência, auditabilidade e controle humano;
     
  3. A criação de programas de formação para juristas quânticos, com ênfase em lógica da complexidade, ética computacional e teoria crítica do Direito.
     

É verdade que há riscos: viés algorítmico, desigualdades tecnológicas, opacidade nos critérios de decisão. Mas o maior risco é ficarmos parados. A tecnologia não espera. O tempo da Justiça não pode mais esperar.

A computação quântica é um caminho — e um caminho sem volta. Se soubermos atravessá-lo com responsabilidade, sensibilidade e inteligência coletiva, ele poderá nos conduzir a um sistema de Justiça mais ágil, mais justo e mais capaz de acolher a complexidade da vida como ela é.

Jorge Tardin
 Advogado, professor e tesoureiro da OAB/Búzios
 jorge@tardin.com.br 

Por Ultima Hora em 25/03/2025

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