A verdadeira história de Jânio Quadros e seu famoso “Fi-lo porque qui-lo”

A verdadeira história de Jânio Quadros e seu famoso “Fi-lo porque qui-lo”

Em 1958, Juracy Magalhães, presidente da UDN, Carlos Lacerda, líder na Câmara, e Jânio Quadros, governador de São Paulo, prepararam a convenção nacional da UDN para fazer Herbert Levy o sucessor de Juracy. Magalhães Pinto chegou lá na véspera com José Aparecido, entrou na convenção, derrotou Herbert Levy. Jânio ficou Furioso. 

No dia seguinte, Magalhães chamou Aparecido e foram os dois fazer uma visita de cortesia a Jânio. Anunciados, foram levados ao gabinete. Jânio estava sentado, cabeça baixa, escrevendo. Nem levantou os olhos. Os dois, de pé, esperando. Jânio escrevendo. De repente, levanta-se, estende a mão para Magalhães: 

– Como vai o senhor, doutor Bilac Pinto? 

– Muito bem, doutor Adhemar. 

Jânio deu uma gargalhada, Magalhães sorriu. Ficaram amigos. 

ATRÁS DO POVO – Candidato a presidente, Jânio foi a Caxias, no Rio Grande do Sul. A convite do padre Giordani, vereador do PDC e coordenador da campanha na cidade. O padre tinha convidado o povo para saudar Jânio nas ruas, quando chegasse, às 6 da tarde, e para o comício à noite. 

No aeroporto, um carro aberto esperava o candidato para um desfile triunfal pela cidade. Jânio chamou o padre: 

– Nada disso. Quero um carro fechado, bem fechado. Vou direto para o hotel e por ruas ínvias, sem passar pelo centro. Tu-do mui-to rá-pi-do. 

– E o povo, presidente? 

– O povo? Quem conhece o povo sou eu, senhor padre. Conheço nas faces e na alma. O povo quer mais me ver do que me ouvir. Pois se quiser me ver que vá também me ouvir no comício. Ver-me-á e ouvir-me-á. 

Às 8 da noite, Caxias estava toda na Praça. Vendo e ouvindo Jânio. 

Confinado em Corumbá, Mato Grosso, em julho de 1968, por causa de uma declaração contra Costa e Silva (responsável por sua cassação: – “Esse zarolho é meu”, e escreveu a mão o nome de Jânio no alto do primeiro listão), Jânio soube que um amigo chegara para visitá-lo. Ligou para a portaria, pediu o número do apartamento, foi lá. Desceu furioso para a recepção: 

– Meus queridos, que estúpidos, que parvos são vocês. Deram-me o número errado. 

 Toco a campainha. Aparece alguém, que não é o meu amigo, e nu, inteiramente nu. 

Saibam, não tenho nada contra homem nu. Mas nu e de óculos? Pelado, sim. Mas de óculos? 

FI-LO PORQUE QUI-LO – A verdadeira história do fi-lo porque qui-lo é esta. Como Presidente, Jânio instituiu reuniões mensais, presididas por ele, entre as autoridades federais e os governadores das várias regiões do país. No sul, Jânio estava reunido com os governadores Leonel Brizola, do Rio Grande, Ney Braga, do Paraná, e Celso Ramos, de Santa Catarina. E anunciou algumas reformas educacionais. 

O ministro da Educação, Brígido Tinoco, pego de surpresa, ficou uma fera. Depois do almoço, procurou Jânio: 

– Presidente, permita-me dizer-lhe que discordo de algumas dessas propostas. E nem fui avisado. Fê-lo por que? 

– Ministro, fi-lo por algumas razões que me parecem relevantes. Primeiro, fi-lo porque estou convencido de que é a melhor solução. Segundo, fi-lo porque esta nação tem pressa.  

Terceiro, fi-lo porque sou presidente. Como vê, senhor ministro, fi-lo porque qui-lo. 

E papo encerrado. Papo e pronomes. 

Sebastião Nery 

Charge do Otelo (Arquivo O Globo).

Por em 30/03/2021
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