Barcas S/A e o alto custo pela tarifa do transporte

Barcas S/A e o alto custo pela tarifa do transporte

A CCR Barcas estabeleceu a ponte entre o quadro do pintor renascentista Hieronymus Bosch “A Barca dos Tolos”, e a cidade de Niterói; pagando o valor unitário de R$ 6,50 pela passagem até o Rio de Janeiro, o cidadão niteroiense arca com um alto custo pela tarifa do transporte, e fornece à Concessionária os meios de se enriquecer às custas dos “tolos”, isto é, da população; desde o ano de 2012, a Barcas S/A já foi por diversas vezes, condenada pela Justiça a indenizar seus passageiros, em virtude de acidentes completamente evitáveis, como o do catamarã que feriu quinze pessoas, em 2018, ou da barca, que feriu dezoito pessoas, em 2010, e até mesmo por atrasos das viagens, que impediram os passageiros de chegar em tempo em seus empregos, como aconteceu em 2009, mas ainda assim, a péssima qualidade do serviço de transporte aquaviário não foi suficiente para o Poder Executivo retomar a concessão e encampar o transporte entre as duas cidades.

Possibilidade não faltou; em 13 de abril de 2010, a juíza Maria Paula Gouvêa Galhardo, da 4ª Vara de Fazenda Pública da Capital julgou procedente, em parte, ação popular ajuizada em 2001 pelo Deputado Estadual Carlos Minc, sendo litisconsorte ao lado do Deputado o escritor Eduardo Banks, em face da concessionária Barca S/A., declarando a caducidade na concessão das linhas Praça XV/Charitas, Praça XV/São Gonçalo, Praça XV/Guia de Pacobayba, Praça XV/Barra da Tijuca e Rio de Janeiro, determinando que o Estado do Rio de Janeiro, como poder concedente, reavesse as parcelas do serviço público respectivas, podendo licitá-las livremente; a concessionária, porém, apelou, e encontrou na 15ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro acolhimento ao seu pedido de continuar explorando as concessões, inclusive das linhas que jamais forneceu à população, porque, segundo o Desembargador Ricardo Rodrigues Cardoso, “caberia ao Poder Concedente verificar a conveniência da declaração da caducidade da concessão”, e que “declarar ou não a caducidade do direito de exploração das linhas (...) se insere no juízo de discricionariedade do Poder Concedente”.

Vale dizer: se a concessionária não presta o serviço à população, isso fica entre o Poder Executivo e a própria empresa, e o Judiciário não pode determinar a retomada da linhas.

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De longe e longe, a transferência do Governo Estadual para a iniciativa privada vem do final da Administração de Marcello Alencar, em 1998, quando o controle acionário foi transferido, por contrato em regime de concessão, com o prazo de 25 anos (vencendo em 2023), para a Companhia de Navegação do Estado do Rio de Janeiro (CONERJ), pelo módico valor, pago à vista na época, de R$ 26.412.000,00 (vinte e seis milhões, quatrocentos e doze mil reais).

Para piorar, a Barcas S/A desativou o serviço seletivo do Centro de Niterói, mantendo apenas o de Charitas a um custo caríssimo. Além disso, embasada no pretexto de a concessão do serviço Niterói - Rio ser dita "social", não liga o ar-condicionado das novas barcas, que estariam já equipadas para isso. Diz-se que a concessão seletiva é "de luxo", apesar de o serviço nunca ter correspondido a isso. Descumprindo o item “Ventilação natural das áreas destinadas a passageiros assegurando-se renovação de ar satisfatório, consoante os padrões de higiene”.

Porém, um fato estranho — continua até hoje sem explicação — ocorrido com o Consórcio BARCAS S.A., é que embora o ex-governador Marcelo Alencar tenha dito que o motivo da privatização da CONERJ eram os investimentos que seriam feitos pelos novos donos, possibilitando a criação imediata das novas linhas para Charitas, Barra da Tijuca, Magé e São Gonçalo, quem liberou um empréstimo de R$ 172.000.000,00 (cento e setenta e dois milhões de reais) para a compra de 10 (dez) catamarãs e a revitalizar 14 (quatorze) embarcações foi o BNDES, embora o contrato obrigasse a Concessionária a investir em melhorias e manutenção do transporte por conta própria, em abril de 2002.

Pelo visto, o dinheiro público para financiar a propriedade privada — mais uma vez e como sempre — foi desviado para outras finalidades, haja vista que não foram criadas as novas linhas para Barra da Tijuca, Magé e São Gonçalo, e que as embarcações do Consórcio BARCAS S.A., continuaram sendo as mesmas de muito antes da privatização e, por falta de manutenção adequada, continuam até hoje de vez enquanto andando a deriva pela baía, pondo em risco as vidas de milhares de passageiros.

Assim é que Niterói, cada vez mais, navega na “barca dos tolos”, enquanto empresários e políticos viajam de primeira classe com o dinheiro das passagens pagas pelos munícipes; a série de reportagens de “Tribuna da Imprensa”, iniciada hoje, contará mais um pouco sobre os encontros e desencontros das concessões de transportes públicos como barcas e metrô, exploração de vias expressas, recordando à população como é que o mundo gosta de ser enganado.

Foto: Reprodução / "O Barco dos Tolos" de Hieronymus Bosch.

Por Ralph Lichotti - Advogado e Jornalista, Diretor do Tribuna da Imprensa, Secretário Geral da Associação Nacional, Internacional de Imprensa - ANI, Ex-Presidente da Comissão de Sindicância e Conselheiro da Associação Brasileira de Imprensa - ABI - MTb 31.335/RJ

Presidente da Associação Nacional de Defesa dos Usuários de Transportes

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*Este texto é de total responsabilidade de seus idealizadores

 

Por Ralph Lichotti em 11/03/2021
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