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O novo pacote fiscal apresentado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem provocado mais ondas do que calmarias. Enquanto o governo tenta equilibrar as contas públicas e promover a justiça social, as medidas anunciadas parecem ter conseguido o raro feito de desagradar praticamente todos os setores. Além dos cortes e ajustes controversos, o pacote sofre de um grave erro de comunicação e estratégia que só amplifica a insatisfação geral.
Anunciado, como um esforço para sanar as finanças públicas e reduzir desigualdades, o pacote fiscal gerou reações intensas e polarizadas. Curiosamente, consegui descontentar tanto os setores mais conservadores quanto os progressistas, ampliando o coro das críticas em múltiplas variedades.
O conteúdo do pacote: promessas para o futuro, impactos no presente.
O pacote visa economizar R$ 70 bilhões até 2026, mas inclui medidas impopulares: contenção no reajuste do salário mínimo, revisão de benefícios sociais e reformas fiscais que ainda dependem de aprovação no Congresso. A prometida ampliação da faixa de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil mensais, ao contrário do que muitos entenderam inicialmente, só será efetivada em 2026. Resultado? Frustração generalizada entre assalariados que esperavam um alívio imediato.
Entre as medidas mais controversas está a imposição de idade mínima para reformas militares e as limitações nas pensões. Apesar da resistência das Forças Armadas, essas mudanças representam um avanço em termos de justiça previdenciária, combatendo privilégios históricos e promovendo maior equidade no sistema. É, sem dúvida, um dos poucos pontos positivos e consensuais do pacote.
Reações: o mercado fala alto, e a base reage com indignação.
O mercado financeiro, conhecido por suas reações emocionais, não ficou satisfeito. Com o dólar superando a marca de R$ 6 pela primeira vez, os investidores demonstraram desconfiança na capacidade do governo de implementar os ajustes necessários enquanto ainda promete benefícios futuros. O temor de que a promessa de zerar o déficit fiscal se transforme em mais um compromisso não cumprido está no ar.
Ao mesmo tempo, setores progressistas e a base política do governo manifestaram forte descontentamento. Medidas como a redução dos ganhos reais no salário mínimo e os cortes nos benefícios sociais foram vistas como retrocessos, incompatíveis com as expectativas de um governo que se propunha a priorizar os mais vulneráveis.
Nem mesmo as ações aparentemente populares, como o combate aos altos escalões do funcionalismo público, foram suficientes para equilibrar a balança. Os cortes no topo não compensaram os impactos negativos percebidos na base, ampliando a sensação de desconexão entre o governo e sua base social.
Erros de comunicação e estratégia: o calcanhar de Aquiles.
Um dos maiores problemas do pacote não está em seu conteúdo, mas na maneira como foi apresentado. A promessa de ampliação da isenção do Imposto de Renda, mal detalhada, gerou expectativas irreais que rapidamente se transformaram em decepção ao descobrir que o benefício só será efetivado em 2026.
Além disso, o governo subestimou o impacto político ao anunciar medidas impopulares sem articulação prévia no Congresso e junto à sociedade. A narrativa de que “sacrifícios são necessários” perdeu força, especialmente em um contexto de juros altos e inflação que já pressionam os orçamentos familiares.
Conclusão: a conta pode não fechar.
O pacote fiscal de Haddad expõe os desafios de tentar contemplar a todos sem uma estratégia clara, resultando em insatisfações generalizadas. Apesar dos méritos em algumas medidas, como a reforma previdenciária que combate privilégios dos militares, a falta de clareza e articulação política transformou o esforço em um tiro no pé.
Caso o governo não ajuste sua abordagem — tanto na comunicação quanto na articulação política —, o risco de naufrágio é real. Equilibrar as contas públicas já é difícil; conquistar a confiança da sociedade nesse processo é ainda mais desafiador.
Com o dólar em alta, críticas de todos os lados e uma base eleitoral cada vez mais insatisfeita, o governo enfrentou um teste de resistência. Haddad está aprendendo, da forma mais difícil, que equilíbrio fiscal sem equilíbrio político pode custar caro — tanto para as finanças públicas quanto para a governabilidade.
Ainda há tempo para virar o jogo. A promoção de avanços concretos, como a reforma das pensões militares, pode ajudar a reconstruir parte da confiança perdida e transformar o pacote em um marco de justiça social. Contudo, será necessário um esforço monumental para que gregos, troianos e aliados vislumbrem algum porto seguro nessa turbulência.
Filinto Branco – colunista político
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