ESPECIAL IV: Pacote anticrime tornou as regras do RDD ainda mais rigorosas, afetando principalmente à saúde mental dos detentos – por Daniel Mazola

ESPECIAL IV: Pacote anticrime tornou as regras do RDD ainda mais rigorosas, afetando principalmente à saúde mental dos detentos – por Daniel Mazola

Por Daniel Mazola 

“A técnica penitenciária e o homem delinquente são de algum modo irmãos gêmeos. Delinquência é a vingança da prisão contra a justiça. A prisão é a região mais sombria da justiça” (Michel Foucault)

O RDD é uma medida polêmica e objeto de debates sobre sua eficácia e compatibilidade com os Direitos Humanos. Críticos argumentam que as condições extremamente restritivas levam a violações dos direitos dos detentos e até mesmo contribui para o agravamento de problemas de saúde mental.

Segundo a Dra. Jacqueline Segre, médica psiquiatra e vice-coordenadora da pós-graduação de Psiquiatria Forense do IPq-HCFMUSP – Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo. Quanto mais restrito o isolamento dos presos, maiores são as chances de desenvolver psicoses e de encontrar dificuldades para se reintegrar à sociedade após o período de reclusão.

Regime Disciplinar Diferenciado

O pacote anticrime, sancionado em 2019, por iniciativa do então Ministro da Justiça Sérgio Morotornou as regras do RDD, previstas na lei de execução penal, mais rigorosas. O regime, com duração máxima de até dois anos, é aplicável a detentos nacionais ou estrangeiros, e as visitas ocorrem quinzenalmente em instalações que impedem o contato físico e a passagem de objetos.

Sérgio Moro. (Reprodução/Wilson Center)

O banho de sol é permitido em grupos de até quatro presos, desde que não haja contato com membros do mesmo grupo criminoso. Todas as entrevistas são monitoradas, exceto aquelas com advogados, e a participação em audiências judiciais ocorre preferencialmente por meio de videoconferência.

Veja a íntegra do dispositivo:

Art. 52. A prática de fato previsto como crime doloso constitui falta grave e, quando ocasionar subversão da ordem ou disciplina internas, sujeitará o preso provisório, ou condenado, nacional ou estrangeiro, sem prejuízo da sanção penal, ao regime disciplinar diferenciado, com as seguintes características:

I – duração máxima de até 2 (dois) anos, sem prejuízo de repetição da sanção por nova falta grave de mesma espécie;

II – recolhimento em cela individual;

III – visitas quinzenais, de 2 (duas) pessoas por vez, a serem realizadas em instalações equipadas para impedir o contato físico e a passagem de objetos, por pessoa da família ou, no caso de terceiro, autorizado judicialmente, com duração de 2 (duas) horas;

IV – direito do preso à saída da cela por 2 (duas) horas diárias para banho de sol, em grupos de até 4 (quatro) presos, desde que não haja contato com presos do mesmo grupo criminoso;

V – entrevistas sempre monitoradas, exceto aquelas com seu defensor, em instalações equipadas para impedir o contato físico e a passagem de objetos, salvo expressa autorização judicial em contrário;

VI – fiscalização do conteúdo da correspondência;

VII – participação em audiências judiciais preferencialmente por videoconferência, garantindo-se a participação do defensor no mesmo ambiente do preso.

§ 1º O regime disciplinar diferenciado também será aplicado aos presos provisórios ou condenados, nacionais ou estrangeiros:

I – que apresentem alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal ou da sociedade;

II – sob os quais recaiam fundadas suspeitas de envolvimento ou participação, a qualquer título, em organização criminosa, associação criminosa ou milícia privada, independentemente da prática de falta grave.

§ 2º (Revogado).

§ 3º Existindo indícios de que o preso exerce liderança em organização criminosa, associação criminosa ou milícia privada, ou que tenha atuação criminosa em 2 (dois) ou mais Estados da Federação, o regime disciplinar diferenciado será obrigatoriamente cumprido em estabelecimento prisional federal.

§ 4º Na hipótese dos parágrafos anteriores, o regime disciplinar diferenciado poderá ser prorrogado sucessivamente, por períodos de 1 (um) ano, existindo indícios de que o preso:

I – continua apresentando alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal de origem ou da sociedade;

II – mantém os vínculos com organização criminosa, associação criminosa ou milícia privada, considerados também o perfil criminal e a função desempenhada por ele no grupo criminoso, a operação duradoura do grupo, a superveniência de novos processos criminais e os resultados do tratamento penitenciário.

§ 5º Na hipótese prevista no § 3º deste artigo, o regime disciplinar diferenciado deverá contar com alta segurança interna e externa, principalmente no que diz respeito à necessidade de se evitar contato do preso com membros de sua organização criminosa, associação criminosa ou milícia privada, ou de grupos rivais.

§ 6º A visita de que trata o inciso III do caput deste artigo será gravada em sistema de áudio ou de áudio e vídeo e, com autorização judicial, fiscalizada por agente penitenciário.

§ 7º Após os primeiros 6 (seis) meses de regime disciplinar diferenciado, o preso que não receber a visita de que trata o inciso III do caput deste artigo poderá, após prévio agendamento, ter contato telefônico, que será gravado, com uma pessoa da família, 2 (duas) vezes por mês e por 10 (dez) minutos.” (NR)

Impacto do RDD na saúde mental

Como as condições restritivas do RDD afetam o estado psicológico dos detentos, especialmente em relação à saúde mental? Segundo a psiquiatra Jacqueline Segre, quanto mais restrito o isolamento dos presos, maiores são as chances de desenvolver psicoses, que envolvem uma ruptura com a percepção da realidade, e de encontrar dificuldades para se reintegrar à sociedade após o período de reclusão.

“Evidências apontam que o confinamento solitário pode resultar não apenas em quadros psicóticos, mas também no surgimento de depressão e em uma deterioração global do bem-estar psicológico do indivíduo”, acrescenta ela.

De acordo com a especialista, o isolamento aumenta o risco de adoecimento e prolonga a persistência dessas condições mesmo após o término da restrição.

“É claro que quanto mais longo for o período de isolamento, maiores são as chances de desenvolver quadros psicóticos, que podem ter repercussões significativas no sistema prisional e, a longo prazo, na reintegração desses indivíduos à sociedade.”

A médica conclui afirmando que estudos indicam que períodos prolongados de isolamento tendem a aumentar o estresse psicológico e, consequentemente, o risco de doenças mentais graves, como psicose e transtornos de humor.

“Então, novamente, os estudos vão mostrando que períodos maiores de isolamento tendem a gerar maiores estresse psíquicos e, portanto, maior adoecimento, principalmente no nível da psicose e dos transtornos de humor.”

Documentos da denúncia:

Protocolo de Petição na CIDH

PARTE_1_assinado

PARTE 2

*Com informações do Ministério Público do Estado do Mato Grosso e portal Migalhas. 

Leia ainda:

SÉRIE ESPECIAL: COMISSÃO DA OEA RECEBE DENÚNCIA CONTRA MANUTENÇÃO DE ‘MARCINHO VP’ NO RDD

ESPECIAL II: RDD é inconstitucional e farsa para captar votos e calar a imprensa

ESPECIAL III: Sérgio Moro, emitiu a portaria 157, impedindo qualquer contato físico entre visitantes e presos custodiados no RDD – por Daniel Mazola

ESPECIAL IV: Pacote anticrime tornou as regras do RDD ainda mais rigorosas, afetando principalmente à saúde mental dos detentos – por Daniel Mazola

ESPECIAL V: Maus tratos e tortura perpetrados contra o reeducando Marcio dos Santos Nepomuceno (Marcinho VP) – por Daniel Mazola

DANIEL MAZOLA – Jornalista profissional (MTb 23.957/RJ); Editor-chefe do jornal Tribuna da Imprensa Livre; Consultor de Imprensa da Revista Eletrônica OAB/RJ e do Centro de Documentação e Pesquisa da Seccional; Membro Titular do PEN Clube – única instituição internacional de escritores e jornalistas no Brasil; Pós-graduado, especializado em Jornalismo Sindical; Apresentador do programa TRIBUNA NA TV (TVC-Rio); Ex-presidente da Comissão de Defesa da Liberdade de Imprensa e Direitos Humanos da Associação Brasileira de Imprensa (ABI); Conselheiro Efetivo da ABI (2004/2017); Foi vice-presidente de Divulgação do G.R.E.S. Estação Primeira de Mangueira (2010/2013). 

SIRO DARLAN – Advogado e Jornalista; Editor e Diretor do Jornal Tribuna da imprensa Livre; Ex-juiz de Segundo Grau do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ); Especialista em Direito Penal Contemporâneo e Sistema Penitenciário pela ENFAM – Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados; Mestre em Saúde Pública, Justiça e Direitos Humanos na ENSP; Pós-graduado em Direito da Comunicação Social na Universidade de Coimbra (FDUC), Portugal; Coordenador Rio da Associação Juízes para a Democracia; Conselheiro Efetivo da Associação Brasileira de Imprensa; Conselheiro Benemérito do Clube de Regatas do Flamengo; Membro da Comissão da Verdade sobre a Escravidão da OAB-RJ; Membro da Comissão de Criminologia do IAB. Em função das boas práticas profissionais recebeu em 2019 o Prêmio em Defesa da Liberdade de Imprensa, Movimento Sindical e Terceiro Setor, parceria do Jornal Tribuna da Imprensa Livre com a OAB-RJ.

Por Ultima Hora em 01/04/2025

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