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1924 – 2021. Decano Hélio Fernandes. In Memorian
Nos últimos anos Hélio Fernandes se comunicou com seus seguidores através do blog: http://heliofernandesonline.blogspot.com editado pelo amigo jornalista Roberto Monteiro Pinho.
*Editoria ANIBRPress
(Um dia antes de seu falecimento (09/3), foi relançada a Tribuna da Imprensa no formato digital, um sonho que se realizou, com ele em vida).
O jornalista Hélio Fernandes nasceu no Rio de Janeiro, em 17 de outubro de 1924 e faleceu neste 10 de março de 2021. É filho de Francisco Fernandes e Maria Fernandes, e irmão de Millôr Fernandes, jornalista, escritor, humorista e teatrólogo. Concluiu o primário no Colégio Estadual Enes de Souza. Em 1936, ingressou no Colégio Pedro II para cursar o secundário. Abandonou os estudos em 1938.
Em 1938, Hélio Fernandes trabalhou como auxiliar de despachante por alguns meses. A experiência terminou quando ele foi preso, acusado de envolvimento no levante integralista ocorrido em maio daquele ano. Depois, conseguiu emprego em um navio cargueiro e viajou pelo mundo.
Voltou ao Rio de Janeiro em 1942. Realizou pequenos trabalhos até ingressar no serviço militar obrigatório. Permaneceu no exército até 1945. Seu irmão, Millôr Fernandes, intermediou, ainda em 1945, o seu primeiro emprego na imprensa. Começou na revista O Cruzeiro, como encarregado do recolhimento dos artigos assinados.
Em 1946, Hélio Fernandes ascendeu ao cargo de assistente do diretor e, ao completar um ano de trabalho, tornou-se diretor de redação da revista. Dois anos depois, foi demitido por Assis Chateaubriand, proprietário de O Cruzeiro, ao contrariar suas diretrizes editoriais e publicar dois artigos defendendo a greve dos alunos da Escola Naval em reportagens publicadas com os títulos “A revolta dos Anjos” e “Anistia para os Aspirantes”.
Após sua demissão, viajou para a Europa e regressou em 1950 ao Rio de Janeiro. Foi convidado por Pompeu de Souza para chefiar a seção de Esportes do Diário Carioca. Aceitou o cargo e procurou reformular o formato e o conteúdo da crônica esportiva do jornal com a contratação de Millôr Fernandes, Fernando Sabino e Paulo Mendes Campos.
Em 1951, Hélio Fernandes se demitiu do Diário Carioca em função da forte crise financeira vivida pelo jornal. No ano seguinte, assumiu a direção da redação da revista Manchete, que passava por sérias dificuldades financeiras com tiragem reduzida a cerca de dois mil exemplares por edição. Hélio Fernandes permaneceu no cargo por 22 meses com carta branca para reformar a revista. Ele renovou o seu quadro de jornalistas contratando nomes como Paulo Mendes Campos, Hélio Pelegrino, Otto Lara Resende, Fernando Sabino e Carlinhos de Oliveira, este com dezessete anos. O principal cronista da revista era Rubem Braga, nome já consagrado no jornalismo e na crítica literária.
Sob a direção de Hélio Fernandes, a revista Manchete passou a utilizar com mais intensidade fotos de mulheres na capa para atrair o público. Em oito meses, a tiragem subiu para cerca de 150 mil exemplares, mas Hélio Fernandes saiu da revista por divergência com os proprietários.
De novembro de 1953 até abril de 1954, ele trabalhou na Tribuna da Imprensa, atendendo o convite de seu amigo Carlos Lacerda, mas saiu do jornal por não serem atendidas suas exigências salariais. De maio até outubro de 1954, sobreviveu fazendo reportagens para a revista A Semana, de Graciliano de Brito.
Ainda em 1954, Hélio Fernandes recebeu o convite do presidente da República, João Café Filho, para dirigir a Rádio Mauá, emissora oficial vinculada ao Ministério do Trabalho. Lá, ele criou o programa Noticioso Mauá, que ia ao ar de hora em hora. Em 1955, deixou a rádio e se tornou assessor de imprensa da campanha eleitoral de Juscelino Kubitschek, então candidato à presidência pelo Partido Social Democrático (PSD) e apoiado pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB).
Com Kubitschek empossado, Hélio Fernandes assumiu, em janeiro de 1956, a direção do vespertino A Noite, jornal que fazia parte das Empresas Incorporadas ao Patrimônio da União, com duas missões: salvar o diário da crise financeira e apoiar Juscelino para diluir os ataques de outros jornais ligados à União Democrática Nacional (UDN). Porém, em maio de 1956, Hélio Fernandes deixou A Noite e passou a compor com a oposição udenista, dirigindo fortes ataques ao presidente que ajudou eleger.
Entre junho de 1956 e maio de 1957, Hélio Fernandes assumiu a direção da Revista da Semana. Logo depois, foi para São Paulo para participar do lançamento de Casa e Jardim. Regressou ao Rio de Janeiro em 1958 e recebeu o convite de Joel Silveira para trabalhar na revista O Mundo Ilustrado, de João Dantas, da qual Mino Carta era colaborador. Na revista, criou e se tornou responsável por escrever a coluna Em Primeira Mão que passou, pouco tempo depois, a ser publicada no Diário de Notícias também de propriedade de Dantas.
Hélio Fernandes apoiou a candidatura vitoriosa de Jânio Quadros da UDN à presidência da República, em 1961. Com a renúncia de Jânio, defendeu, através de sua coluna no Diário de Notícias, uma solução legal para a crise política e deu apoio à posse do vice-presidente João Goulart, do PTB.
No ano seguinte, comprou a Tribuna da Imprensa, periódico que tinha sido de Carlos Lacerda, mas que estavam naquele momento, sob a propriedade de Manuel Francisco Nascimento Brito, do Jornal do Brasil. À frente da Tribuna da Imprensa, Hélio Fernandes passou a combater o governo Goulart.
Apoiou à articulação de grupos políticos que redundaram no movimento militar de 31 de março de 1964, responsável pela subida do general Castelo Branco ao poder. Mas logo depois, utilizou a Tribuna da Imprensa para escrever artigos agressivos contra as medidas que visavam ampliar a entrada de capital estrangeiro no país e centralizar as ações políticas do governo, como o Ato Institucional nº 1. Através deste ato, o poder Executivo assumiu parte das prerrogativas constitucionais que lhe dava poder para perseguir e punir quem julgava ser adversário do regime. Hélio Fernandes passou a responder a 27 processos movidos pelo governo militar.
Em 1966, já no bipartidarismo imposto pelos militares, Hélio Fernandes teve a sua candidatura a deputado federal pelo Movimento Democrático Brasileiro (MDB) impugnada pelo Tribunal Regional Eleitoral. No dia 10 de novembro daquele ano, seus direitos políticos foram cassados por dez anos. Dois dias depois, foi preso quando saía de um debate na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. O jornalista também foi impedido de assinar seus artigos e passou utilizar o pseudônimo de João da Silva.
No ano seguinte, Hélio Fernandes foi preso por 30 dias na ilha de Fernando de Noronha e mais 30 na base aérea de Pirassununga, em São Paulo, por ofender através de um obituário escrito na Tribuna da Imprensa a memória de Castelo Branco, morto num acidente aéreo em 18 de agosto de 1967. O jornal sofreria um dura censura nos oito meses seguintes.
Com a vigência do Ato Institucional nº 5, Hélio Fernandes foi preso em 13 de dezembro de 1968 na redação da Tribuna da Imprensa e levado para um regimento da polícia militar do Exército, onde permaneceu por 30 dias na companhia de Oswaldo Peralva, Celso Nascimento Filho, Carlos Lacerda e Mário Lago. Na prisão, rompeu politicamente com Carlos Lacerda.
A ditadura militar fechou a Tribuna da Imprensa por três dias em setembro de 1969, em função de o seu colunista Oliveira Bastos escrever um artigo considerado ofensivo pelos militares à honra pessoal do ministro da Fazenda, Delfim Neto. No mês seguinte, Hélio Fernandes foi preso novamente e confinado por 15 dias em Campo Grande (MS) por publicar reportagens revelando a existência de divergências entre os militares para a escolha do novo presidente da República.
Com a abertura política, em 1974, os editoriais de Hélio Fernandes retomaram a agressividade do passado. Ele passou a denunciar a existência de corrupção em diversos escalões do governo e sofreu processo por ofensa ao presidente Ernesto Geisel, em outubro de 1978.
Em 1979, participou da campanha pela anistia ampla geral e irrestrita e pela convocação de uma Assembléia Nacional Constituinte. Com a volta do pluripartidarismo, se filiou ao Partido Popular, organizado no Rio de Janeiro pelo então governador Chagas Freitas, dono do jornal O Dia.
Em 1981, a Tribuna da Imprensa foi vítima de um atentado à bomba que destruiu suas instalações e máquinas rotativas. Os militares acusaram Hélio Fernandes de forjar o ato para impedir que os equipamentos do jornal fossem confiscados em função dos débitos da Tribuna com a Previdência Social. O jornalista, por sua vez, acusou grupos paramilitares ligados ao Exército de comandarem a ação.
O jornalista participou ativamente da campanha da Aliança Democrática, coalizão formada pelo Partido do Movimento Democrático Brasileiro e por políticos governistas que viriam a formar o Partido da Frente Liberal. O objetivo era garantir a eleição indireta de Tancredo Neves no Colégio Eleitoral.
No final de 1984, Hélio Fernandes ganhou na Justiça uma ação de indenização movida contra a União, pelos danos financeiros que a censura e a perseguição política promovida pelos governos militares causaram à Tribuna da Imprensa.
Nos anos 1990, o jornalista continuou mantendo o tom polêmico de seus editoriais e artigos na Tribuna da Imprensa. De um lado, estes escritos ganharam teor nacionalista permitindo Hélio Fernandes se aproximar de antigos desafetos como o governador Leonel Brizola. De outro, o teor acusatório e a agressividade de suas denúncias acabaram levando o jornalista a ser processado diversas vezes na Justiça por calúnia e injúria.
Com a violenta censura à imprensa imposta principalmente com o AI-5 em 1968, foi preso várias vezes, inclusive no DOI-CODI, foi afastado compulsoriamente do Rio de Janeiro e obrigado a passar períodos de exílio interno em Fernando de Noronha e em Pirassununga (SP). Ao contrario de outros donos de jornal, nunca aceitou a censura e nunca deixou de tentar publicar as notícias do período. Seu jornal foi o que mais sofreu intervenção durante o Regime Militar: teve mais de vinte apreensões e censores instalados dentro de seu prédio por dez anos e dois dias. Em 1973 foi preso por seis dias no quartel da Polícia do Exercito na rua Barão de Mesquita.
In Memorian.
Foto: Acervo pessoal.