Manifesto Contra a Legalização das Drogas no Brasil

Por uma Política Antidrogas moderna, humana e baseada em evidências científicas

Manifesto Contra a Legalização das Drogas no Brasil

Por Ronaldo Laranjeira*

Estamos diante do maior problema de Saúde Pública e de Segurança existente, hoje, no Brasil: a epidemia do uso de drogas. É tarefa de todos os brasileiros colaborar para que ela seja enfrentada e reduzida. Nossa população, principalmente os milhões de jovens, mais vulneráveis a este mal devastador, e suas famílias, podem e devem sonhar com um futuro melhor para todos!

Individualmente, somos cientistas, profissionais da Saúde, parlamentares, religiosos, comunicadores, professores e sobretudo pais, preocupados com o risco inerente à decisão de se dar tratamento equivocado a uma gravíssima questão social. É o que vem acontecendo e é o que certamente se agravará com tal estratégia, simplista na forma e danosa nas consequências.

  1. A alarmante situação brasileira

O consumo de drogas não é um mal que se restrinja somente aos usuários. As consequências sociais, psicossociais e econômicas do consumo de drogas se multiplicam muito além deles. No âmbito familiar, segundo dados recentemente divulgados pela Universidade Federal de São Paulo, para cada dependente de drogas ilícitas existem, em média, mais quatro pessoas afetadas de forma devastadora, comprometendo, em inúmeras dimensões, uma população de quase 30 milhões de brasileiros. No âmbito social, parte substantiva da violência a que está exposta nossa população guarda estreito vínculo causal com o consumo de drogas. E o consumo vem aumentando continuamente no Brasil, ao longo dos últimos vinte anos! O Conselho Internacional de Controle de Narcóticos, entidade ligada à ONU, emitiu relatório informando que em apenas seis anos, entre 2005 e 2011, o consumo de cocaína, em nosso país, avançou de 0,7% para 1,75% da população na faixa etária entre 12 e 65 anos. Isso corresponde a uma adesão ao uso problemático e à dependência quatro vezes superior à média mundial e 25% maior que a média da América do Sul.

Nesse cenário, há que sublinhar dois fatos irrecusáveis. De um lado, a enorme dificuldade, em todos os níveis de governo, de eleger e adotar políticas que sejam efetivas, quer na prevenção, quer no tratamento. De outro, essa ineficiência convive com verdadeiro lobby, muito bem organizado, difundindo a ideia de que a melhor solução seria a completa legalização de todas as drogas, começando pela maconha. Essa estratégia está muito evidente. Primeiro se descrimina o uso, depois o “pequeno tráfico”, em seguida se legaliza a maconha para uso “medicinal” e recreativo, para finalmente legalizar todas as drogas.

Faz parte desse lobby pela legalização, o argumento de que o álcool e o tabaco, não obstante causarem dependência e transtornos físicos e mentais, têm seu consumo legalizado. Então, concluem – “Por que não legalizar as demais drogas?”. Ora, fazê-lo seria andar na contramão do bom senso e do que a experiência ensina em relação ao álcool e ao tabaco. Exatamente por sabermos que ambos são danosos à saúde dos indivíduos e à saúde pública, os signatários deste manifesto são favoráveis, também, ao aumento das restrições ao consumo dessas duas substâncias.

 

A história do mundo, nos últimos 200 anos, é rica em exemplos de países que liberaram as drogas aqui consideradas ilícitas, e sofreram verdadeiras tragédias sociais. Todos voltaram atrás, sem exceção, e aumentaram o rigor no seu enfrentamento. A redução do número de dependentes químicos e da mortalidade pela violência, só aconteceu nos países que trataram essa questão com muito rigor!

  1. Um debate falso e inútil

É preciso quebrar a polarização instalada no debate nacional e internacional sobre as melhores políticas a serem adotadas para o controle das drogas ilícitas. Os defensores da legalização creem que uma singela mudança legislativa seja o bastante para resolver tão complexo problema. Os que optam pela repressão pura e simples, defendem uma solução punitiva, dominantemente penal. Os primeiros querem só eliminar as penas. Os outros, só endurecê-las. E ambos parecem convencidos de que isso baste.

Não bastará. Nenhuma dessas duas abordagens, é suficientemente humana, realista, efetiva, ou se baseia nas melhores evidências científicas disponíveis. Vários países, como os Estados Unidos, Reino Unido, Suécia, Itália, estão trilhando uma “terceira via” em relação ao controle das drogas. Estabelecida a partir de evidências científicas, essa abordagem coloca ênfase na prevenção e no tratamento.

O Brasil precisa mudar o falso dilema em que se digladiam as atuais abordagens do assunto. Com esse intuito, propomos:

  1. Os 10 princípios de uma boa política antidrogas

1º – Os Direitos Humanos são parte fundamental dessa política. Os cidadãos, em especial as crianças, têm o direito de viver num ambiente seguro e livre de drogas, quer em sua família, quer na comunidade.

2º – A redução do consumo de drogas nas comunidades deve estar no núcleo dessa política. A melhor forma de reduzir os danos causados pelas drogas é reduzir o consumo. Em epidemias virais, o mais importante é diminuir rapidamente a circulação do vírus. Vale o mesmo para as drogas. Sem diminuir sua circulação nas ruas, os problemas só serão agravados.

3º – O Brasil é o único país do mundo que faz fronteira – gigantesca fronteira! – com todos os produtores de coca. Por isso, temos que ser muito mais rigorosos no controle que outros países, para podermos diminuir a circulação e a oferta dessa destruidora mercadoria. Aderir à facilidade de acesso ou dificultar a ação de combate ao tráfico agravará a situação e facilitará o aumento da disponibilidade. E o consumo, inevitavelmente, crescerá. Para isso o uso e o tráfico devem continuar sendo considerados crimes, e devem ser punidos. O primeiro com penas alternativas, que podem incluir medidas com as da Justiça Terapêutica, e o segundo com prisão prolongada.

4º – Uma boa política nacional em relação às drogas deve reconhecer que a dependência química é uma doença crônica do cérebro, que deve ser tratada e, antes disso, prevenida. Tanto a Saúde Pública quanto a Segurança Pública estabelecem ações complementares, necessárias e que devem estar presentes.

5º – As atividades de Prevenção, Tratamento e os Serviços de Recuperação, devem integrar-se no Sistema de Saúde pública. O SUS deve implementar práticas de tratamento baseadas em evidências. E deve abandonar de vez a “redução de danos” como política única, tanto para prevenção quanto para tratamento.

6º – Um plano de prevenção, municipalizado, deve proporcionar atendimento adequado. É indispensável que sejam criados programas específicos, para todas as crianças e adolescentes do país e, em especial, para grupos de risco, como são, por exemplo, os que abandonam precocemente a escola. Os profissionais da Saúde e da Educação devem estar plenamente capacitados para exercer atividades de prevenção e detecção precoce do uso.

7º – O que hoje é disponibilizado como sistema de tratamento é escasso e inadequado. Faz-se necessário abandonar a exclusividade dos Centros de Atenção Psicossocial para Álcool e Drogas (CAPS-AD) como a única alternativa de tratamento. O SUS deve financiar clinicas de desintoxicação e as Comunidades Terapêuticas. O acesso ao tratamento de qualidade deve ser direito de todo usuário do SUS. Sem isso, precisamente as famílias mais carentes de recursos não têm como ser socorridas. As internações, voluntárias ou não, em locais adequados, com critérios médicos competentes devem estar disponíveis a quem necessite, na hora da necessidade.

8º – As famílias devem ter acesso a programas de orientação específicos, que proporcionem o conhecimento dos meios de prevenção ao uso de substâncias. Pais, mães, avós, chefes de família, devem ser os primeiros “agentes de prevenção”, a começar pelas substâncias lícitas, como álcool e tabaco. Além disso, devem estar previamente informados sobre como lidar se e quando algum de seus membros começar a usar drogas, bem como conhecer estratégias de desestímulo ao consumo. É imprescindível o suporte do poder público e das comunidades aos grupos de apoio que precisam tornar-se a primeira mão estendida para os familiares com problemas.

9º – O sistema de recuperação social, ou seja, o conjunto das ações que devem acontecer após a interrupção do uso não prescinde de amplo suporte estatal e social. São ações como as levadas a cabo por Igrejas no apoio à recuperação e reinserção social, e pelos grupos de ajuda mútua – Alcoólicos Anônimos (AA), Narcóticos Anônimos (NA), Amor Exigente (AE). Tal apoio precisa abranger a reabilitação profissional das pessoas em recuperação.

10º – A rede de pequenos e médios traficantes ampliou-se enormemente nos últimos anos. Faz-se urgente definir estratégias para desorganizá-la. Além das indispensáveis ações policiais e penais, é preciso, no âmbito de cada município, monitorar a ação dos pequenos traficantes. Os defensores da liberação confundem, intencionalmente, os pequenos traficantes com os usuários. Defendem a retirada da pena de prisão para os primeiros, alegando serem usuários que traficam para manter o vício. Ora, mais de 90% do tráfico que chega aos consumidores é levado pelo pequeno traficante. A rede de pequenos e médios traficantes ampliou-se enormemente nos últimos anos. Faz-se urgente definir estratégias para desorganizá-la. É preciso, no âmbito de cada município, monitorar a ação dos pequenos traficantes.

Se não for possível tirá-los das ruas, todo esforço para diminuir a oferta será inócuo. Esses pequenos traficantes devem ser internados em unidades prisionais especiais, com tratamento associado. Tirá-los da rua é essencial para desorganizar o tráfico e diminuir a circulação das drogas.

Por Ultima Hora em 02/08/2023
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