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Prof. Jorge Tardin
jorge@tardin.com.br
Entre todas as cidades brasileiras, Nova Friburgo se destaca não apenas por sua trajetória de autonomia administrativa, mas também por seu papel único na formação do país. Antes da fusão do antigo Estado do Rio de Janeiro com a Guanabara, em 1975, o município era um raro caso de gestão independente, infraestrutura própria e desenvolvimento econômico sustentável. Mais do que isso, Friburgo foi a primeira colônia oficial de suíços e alemães no Brasil, estabelecida por decreto imperial em 16 de maio de 1818, um fato que a diferenciou de todas as demais cidades brasileiras.
Essa origem singular definiu seu modelo administrativo e social por quase dois séculos, influenciando sua organização política, seu sistema de serviços públicos e seu desenvolvimento econômico. Enquanto a maioria dos municípios brasileiros dependia do governo estadual para fornecer energia elétrica, telefonia, saneamento e infraestrutura, Nova Friburgo administrava seus próprios serviços essenciais, com um nível de autonomia inédito no país.
A fusão de 1975, no entanto, desconsiderou essa realidade e impôs uma centralização que fragilizou a cidade. O modelo de sucesso que Friburgo construiu ao longo de sua história foi desmontado, seus serviços foram estatizados e, posteriormente, privatizados. O resultado foi um município que, antes autônomo, passou a depender de decisões tomadas fora de seu território, com perda de qualidade dos serviços públicos e aumento do custo para a população.
O modelo friburguense: um caso único no Brasil
Nenhuma outra cidade do país combinava autonomia administrativa, infraestrutura independente e um forte senso de identidade cultural como Nova Friburgo. O município não apenas funcionava sem a tutela do governo estadual, mas também se destacava pela qualidade da sua gestão pública e pela eficiência de seus serviços essenciais.
A primeira colônia oficial de suíços e alemães no Brasil
A fundação de Nova Friburgo, em 16 de maio de 1818, foi um projeto imperial pioneiro. Foi a primeira colônia oficialmente estabelecida pelo governo brasileiro para receber imigrantes suíços e, posteriormente, alemães. Esse fator fez com que a cidade adotasse um modelo administrativo inspirado nas tradições europeias de organização comunitária, eficiência e planejamento de longo prazo.
Essa herança definiu a trajetória de Friburgo, fazendo dela um exemplo raro de município planejado, com uma administração pública eficiente e um alto nível de autossuficiência.
Energia elétrica: gestão municipal e tarifas justas
Enquanto a maior parte das cidades do Brasil era atendida por companhias estaduais ou federais, Nova Friburgo possuía sua própria empresa de energia, a Companhia Força e Luz Friburguense. Isso permitia tarifas mais acessíveis, atendimento mais rápido e investimentos alinhados com as necessidades locais.
Saneamento e abastecimento de água: modelo de eficiência
O Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE), criado em 1963, operava de forma independente, sem depender do governo estadual. O município garantia abastecimento seguro e tratamento de esgoto eficiente, superando, em qualidade, o que era oferecido em muitas capitais brasileiras.
Telefonia municipal: comunicação sem burocracia
Diferente da maioria das cidades do interior, Friburgo administrava sua própria telefonia, sem depender da Telerj. Em um Brasil onde conseguir uma linha telefônica podia levar anos, a cidade oferecia um serviço eficiente e ágil, sem a burocracia das estatais.
Faculdade Municipal de Odontologia: um caso único no país
Friburgo foi o único município do Brasil a manter uma faculdade municipal de odontologia, financiada com recursos próprios e reconhecida pela qualidade de ensino. Esse modelo inovador nunca foi replicado em outro lugar.
Infraestrutura rodoviária e rodoviárias municipais
Ao contrário de outros municípios, Nova Friburgo não aguardava decisões estaduais para gerir suas rodoviárias e suas estradas municipais. A cidade investia de forma independente, garantindo mobilidade eficiente e desenvolvimento econômico.
Colégio Nova Friburgo: excelência educacional
Criado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) em 1950, o Colégio Nova Friburgo foi um dos projetos pedagógicos mais inovadores do país, com um modelo de ensino baseado nas melhores práticas internacionais. Nenhuma outra cidade do Brasil tinha uma instituição semelhante. Seu fechamento, em 1977, representou o fim de um experimento educacional de vanguarda.
A fusão e o fim da autonomia friburguense
A fusão do Estado do Rio de Janeiro com a Guanabara desconsiderou completamente as singularidades de Nova Friburgo. O município deixou de ser tratado como uma cidade diferenciada e passou a ser apenas mais um entre tantos outros.
Os impactos foram imediatos e profundos:
A fusão não fortaleceu Friburgo. Pelo contrário, enfraqueceu sua capacidade de decisão e comprometeu seu desenvolvimento autônomo.
Da centralização à privatização
A fusão criou um ciclo perverso: primeiro, os serviços municipais foram estatizados, depois sucateados e, por fim, entregues à iniciativa privada.
O resultado foi uma pior qualidade dos serviços, tarifas mais caras e a perda do controle da população sobre decisões fundamentais.
A resistência friburguense: recuperando a independência
Apesar das perdas impostas pela fusão, Nova Friburgo continua buscando formas de resgatar sua autonomia histórica.
Mesmo após a fusão e a privatização dos serviços essenciais, Nova Friburgo mantém o espírito de resistência que definiu sua fundação.
Conclusão: Friburgo nunca foi comum – e não deve ser tratada como tal
O erro da fusão de 1975 foi tentar encaixar Nova Friburgo em um modelo administrativo que ignorava sua história e sua capacidade de autogestão.
Se havia um município que provava que a descentralização funcionava, esse município era Nova Friburgo. O que deveria ter sido feito era expandir esse modelo para outras cidades, não desmantelá-lo.
Nova Friburgo nunca foi uma cidade qualquer. E sua história prova que não aceitará ser tratada como tal.
* Jorge Tardin é empreendedor social e professor de direito
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