'Precisamos Falar sobre Kevin: Uma reflexão psicológica sobre a violência e a maternidade no contexto atual'

* Vanessa Fontana é Jornalista, CEO da Fontana Produções, mestre em psicanálise, especialista em psicologia humanista, hipnoterapeuta e atriz. Faço parte do Conselho Brasileiro de Psicanálise Clínica. CBPC 2022-624 e da Sociedade Brasileira de Hipnose.

'Precisamos Falar sobre Kevin: Uma reflexão psicológica sobre a violência e a maternidade no contexto atual'

O filme "Precisamos Falar sobre Kevin", dirigido por Lynne Ramsay em 2011 mas que é um assunto super atual, trouxe à tona uma temática delicada e relevante: a violência juvenil e a relação entre mãe e filho. Em uma época em que questões como bullying, transtornos mentais e comportamentos agressivos, ataques em escolas ganham cada vez mais destaque, a história de Kevin nos faz refletir sobre o papel da sociedade contemporânea na formação desses indivíduos.

Análise do filme:
"Precisamos Falar sobre Kevin" apresenta uma narrativa não linear, fazendo uso de flashbacks para explorar a vida de Eva Khatchadourian (interpretada por Tilda Swinton), uma mãe que luta para compreender e lidar com as atitudes violentas de seu filho Kevin (interpretado por Ezra Miller).

Através da lente psicológica, o filme aborda questões profundas, como a influência do ambiente familiar e social na formação da personalidade de Kevin. O personagem retrata um adolescente manipulador, frio e cruel, cujas ações macabras têm consequências devastadoras para a comunidade em que vive.

Atualmente, vivemos em uma sociedade em que questões relacionadas à violência, à agressividade e ao comportamento antissocial são amplamente discutidas. O filme de Ramsay traz à tona a necessidade de abordarmos esses assuntos de maneira mais aberta e franca, reconhecendo que eles são parte integrante do contexto em que estamos inseridos.

Através da analogia com a realidade atual, "Precisamos Falar sobre Kevin" nos convida a refletir sobre as influências do mundo contemporâneo na formação de crianças e adolescentes. O crescimento da exposição a conteúdos violentos, a conectividade exacerbada às redes sociais, a pressão para o sucesso e a busca incessante pela perfeição são apenas alguns dos fatores que podem desempenhar um papel crucial no desenvolvimento de comportamentos problemáticos.

Além disso, o filme nos alerta para a importância da comunicação e do diálogo na prevenção de situações extremas como as retratadas. A falta de comunicação familiar em que Eva não é levada a sério quando alerta sobre o próprio filho Kevin, a sua incapacidade de expressar sentimentos e o isolamento emocional são elementos que contribuem para o desenrolar trágico da história.

"Precisamos Falar sobre Kevin" é um filme que nos convida a uma reflexão profunda sobre a violência, a maternidade e as influências da sociedade atual na formação dos indivíduos, o contexto familiar, a falta de um consenso na educação dos filhos. Ao abordar temas tão sensíveis, a obra nos convida a enfrentar essas questões de forma aberta e franca, criando um espaço para o diálogo e a prevenção. Mais do que nunca, é necessário falar sobre Kevin e sobre tantos outros casos semelhantes, buscando compreender e intervir na jornada emocional de crianças e adolescentes, e assim, construir uma sociedade mais acolhedora, empática e consciente.

No contexto abordado em "Precisamos Falar sobre Kevin", é importante considerar a complexidade das relações familiares e a dinâmica entre pais e filhos. Muitas vezes, quando nos deparamos com comportamentos problemáticos em um filho, buscamos incessantemente por respostas e culpamos a figura materna ou paterna. No entanto, é essencial refletir se realmente podemos atribuir essa responsabilidade a eles.

Mães que têm os dedos apontados em seus rostos, sendo acusadas de serem as responsáveis por um filho agressivo ou dependente químico, muitas vezes são mais vítimas do que culpadas. A influência dos ambientes social e cultural, as experiências vivenciadas pelo filho fora do ambiente familiar, bem como fatores como herança genéticas e biológicas, podem ser determinantes na formação de sua personalidade e comportamento.

É importante considerar que, embora a maternidade possa desempenhar um papel significativo na vida de uma criança, ela não é a única influência. Estudos apontam que a interação entre fatores genéticos, ambientais e relacionais é fundamental para a compreensão do comportamento humano.

Portanto, culpar exclusivamente a mãe, ou qualquer pai ou mãe, pelos comportamentos problemáticos de um filho não leva em consideração toda a complexidade que envolve o desenvolvimento humano. É preciso olhar para além da figura materna e buscar compreender os múltiplos fatores que podem contribuir para o surgimento desses problemas. Muitas vezes, essa mãe se quer consegue ser ouvida dentro de casa.

A reflexão proposta pelo filme nos convida a abandonar a busca por um único culpado e a adotar uma abordagem mais compassiva e compreensiva. Ao invés do julgamento, é necessário oferecer apoio e buscar soluções que levem em consideração todos os aspectos envolvidos na complexa formação da personalidade de um indivíduo.

Em suma, é fundamental compreender que a culpa não pode ser atribuída exclusivamente à mãe nem a qualquer outro progenitor. Todos somos vítimas de um complexo emaranhado de influências sociais, culturais, biológicas e relacionais. A responsabilidade de entender e lidar com questões complexas como a agressividade e a dependência química de um filho deve ser compartilhada por toda a sociedade, promovendo um ambiente de apoio, compreensão e empatia. Se faz necessário ter apoio psicológico, e não podemos tirar também a responsabilidade da escola, dos amigos e até mesmo do Estado.

Por Coluna Vanessa Fontana em 16/11/2023
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