Silvio Santos e Roberto Marinho heróis ou vilões

Por Filinto Branco

Silvio Santos e Roberto Marinho heróis ou vilões

No fim de semana passada, com a morte de Silvio Santos, o Brasil praticamente parou para homenagear o empresário, quase como se ele fosse um herói nacional. A comoção generalizada, no entanto, merece um olhar mais crítico. O povo tem memória curta e frequentemente seletiva, tendendo a romantizar figuras públicas, obscurecendo as complexas relações que marcaram suas trajetórias.

Muitos devem ter se perguntado porque a Globo deu tamanha cobertura ao fato, sabendo que  o SBT é seu concorrente. Para compreender isso,  vamos rever em poucas linhas, quem foram Silvio Santos e Roberto Marinho. É essencial revisitar a relação desses dois magnatas da comunicação com o regime militar, um dos períodos mais sombrios da nossa história.

Roberto Marinho: O Aliado dos Generais

Roberto Marinho, fundador das Organizações Globo, é uma figura central na discussão sobre o papel da mídia durante a ditadura militar. A relação entre a Globo e o regime foi construída sobre um alicerce de interesses mútuos. Enquanto a Globo fornecia apoio editorial, alinhando sua cobertura jornalística com a narrativa oficial, os militares garantiam concessões e incentivos que permitiram ao grupo transformar-se no maior conglomerado de mídia da América Latina.

Durante os anos de chumbo, a TV Globo desempenhou um papel crucial na formação da opinião pública. A emissora evitava críticas ao regime e minimizava os impactos da repressão, ajudando a perpetuar a ilusão de estabilidade e progresso, especialmente durante o período do "milagre econômico". Essa narrativa cuidadosamente construída mantinha a população alheia às brutalidades cometidas pelo Estado, reforçando a legitimidade do regime. Quando a transição democrática se tornou inevitável, Roberto Marinho, sempre atento aos ventos da mudança, reposicionou a Globo para se alinhar ao novo cenário político, garantindo a continuidade de sua influência, a máxima é: sempre com o poder.

Silvio Santos: O Empresário que Sabia Jogar o Jogo

Silvio Santos, conhecido por sua habilidade de adaptação e pragmatismo, soube construir uma sólida relação com os poderes políticos da época. Durante o regime militar, ele não vestiu farda, mas também não deixou de marchar ao som da banda. Enquanto Roberto Marinho fazia dobradinha com os generais, Silvio preferiu algo mais light: em vez de se meter com política, ele apostou no entretenimento popular.

A aproximação com o poder militar não era feita com discursos inflamados ou editoriais apaixonados, mas com a discreta e estratégica amizade com o presidente João Figueiredo, o general que curtia um futebol e, quem sabe, um show do Bozo. Foi dessa maneira, com um aperto de mão aqui e um "quem quer dinheiro" ali, que Silvio conseguiu as concessões que precisava para lançar o SBT em 1981.

O programa "Semana do Presidente" foi um dos exemplos mais notórios da aliança entre Silvio Santos e o regime militar. Exibido pelo SBT por mais de 20 anos. O formato do programa era simples, mas carregado de simbolismo: a cada semana, ele apresentava um resumo das atividades do presidente da República, enfatizando eventos oficiais e declarações que reforçavam a imagem positiva do governo. Durante o período militar, o programa serviu como uma ferramenta de propaganda, destacando os feitos do regime e promovendo uma visão ufanista alinhada aos interesses dos generais.

Esse revival teve um momento de glória em 2019, quando o SBT resolveu dar uma piscadinha para os nostálgicos do regime militar. Com o governo de Jair Bolsonaro no comando, o "Semana do Presidente" voltou ao ar, junto com o slogan “Brasil: Ame-o ou Deixe-o”, direto do túnel do tempo.

Mais uma vez, a receita era simples: exaltar o chefe do Executivo e pintar o país com as cores mais vibrantes da bandeira. Um verdadeiro “show de calouros”.

Conclusão: As Heranças da Ditadura

Fica claro então, porque a Globo enalteceu tanto a figura de Silvio Santos. As trajetórias de Roberto Marinho e Silvio Santos são bastante próximas e revelam a umbilical relação entre mídia e poder no Brasil.

Marinho, com sua habilidade em manipular a opinião pública, e Silvio, com seu pragmatismo empreendedor, foram peças-chave na sustentação do regime, cada um a seu modo. As alianças construídas durante esse período moldaram o cenário midiático brasileiro, cujas consequências reverberam até hoje, portanto não compartilho com tamanha comoção, pois Silvio Santos tá mais pra vilão que herói.

Sem desmerecer o talento de comunicador de Silvio Santos e a capacidade empreendedora de Roberto Marinho, espero ter contribuído para esclarecer aos meus queridos leitores o papel que ambos desempenharam na história recente do país. Revisitar essas relações é essencial para compreender as dinâmicas de poder que ainda moldam o Brasil contemporâneo.

A trajetória desses magnatas da comunicação nos lembra que, por trás das câmeras e dos microfones, poder e influência são construídos e mantidos através de alianças políticas espúrias, cujas implicações muitas vezes só se revelam com o tempo.

 

Por Filinto Branco - articulista político.

Por Ultima Hora em 24/08/2024

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